Uma das fronteiras ideológicas entre esquerda e
direita perpassa pela perspetiva de análise e abordagem às questões sociais, quer
no estabelecimento das causas que lhe estão subjacentes quer na definição e
implementação de medidas de política, tendentes à sua resolução.
Na verdade,
contrariamente às posições de determinados setores do espectro político,
situados à direita, e até mesmo de alguma opinião pública, as ideologias não
acabaram (o capitalismo em que vivemos representa ele próprio uma ideologia
política historicamente decadente), sendo que, quem professa tal entendimento, não
persegue outro propósito, senão a defesa de uma dada linha de orientação
ideológica que prega a resignação e a fatalidade, a submissão ao pensamento
único e à ditadura dos mercados financeiros, numa lógica que justifica a
insustentabilidade do Estado Social, acusando indiscriminadamente os indivíduos
de “viverem acima das suas possibilidades” e responsabilizando-os pela situação
social em que se encontram - desempregados, endividados, pobres.
Esta lógica
conduz à desresponsabilização do Estado e dos governos centrais na obrigação
constitucional de assegurar os direitos sociais dos cidadãos através da
execução das políticas públicas nos domínios da educação, saúde, segurança
social e economia, ou seja, manter e melhorar o funcionamento do Estado Social,
bem como assegurar uma política de redistribuição dos rendimentos por via fiscal,
aplicando um regime de progressividade, cobrando mais de quem mais tem, e
isentando ou aliviando os detentores de menor rendimento, a par, igualmente, da
garantia de uma proporção geral mais justa entre os rendimentos do capital e os
rendimentos do trabalho, privilegiando estes últimos.
Há uma escolha entre dois caminhos.
Um caminho pressupõe que o
Estado ataque a exclusão social e a pobreza, através das políticas públicas
atrás referidas, intervenha diretamente na economia e nos setores estratégicos,
estimule a atividade produtiva privada, o crescimento económico, a coesão
social e territorial (visão de esquerda).
O outro caminho, pressupõe que o
Estado privatize e mercantilize tudo o que mexa à tona da sociedade, deixe que o
mercado funcione só por si e resolva de forma automática as desigualdades e
injustiças sociais (visão de direita).
Dito ainda de outra forma, bem diferente
é atacar as causas dos problemas, promover a solidariedade, a igualdade e a justiça
social, outra coisa, é promover o assistencialismo como trave-mestra da
política social, deixar cada um à mercê das esmolas e do seu destino,
responsabilizando-o, inclusive, pela situação pessoal a que chegou,
estigmatizando todos os que recebem prestações sociais como fraudulentos.
A nível do poder local, também são evidentes as
contradições e a presença das ideologias, na forma como se lida quer com a
problemática social quer com a promoção da atividade económica e do emprego.
Vários
agentes políticos, surpreendentemente, não só de direita, exercem pressão sobre
os Municípios, assacando-lhes responsabilidades desmedidas pelo estado da
economia local (investimento, desemprego, pobreza), como se aquela, não fosse
parte integrante, e não dependesse, da nacional, e das consequências
devastadoras da brutal austeridade levada a cabo nos últimos anos sob os
ditames da troika estrangeira e a cumplicidade ativa da coligação de direita
que governou o país.
Não é demais
repetir que não é possível reparar no plano local o efeito das políticas
nacionais que geraram a degradação social e aumentaram as desigualdades
sociais.
É claro, que com isto, não se visa escamotear ou
desresponsabilizar os Municípios pelas obrigações na área social que
efetivamente possuem, e não deixam de ser relevantes, e as competências que lhes
estão atribuídas, e não deixam de ser importantes, na mitigação dos problemas sociais, e na dinamização da economia
local, num vasto campo de ação e intervenção que mereceria um texto à parte.
Em
tempo de Natal e de família, período que desperta sentimentos que se deveriam estender
ao resto do ano, importa sublinhar a importância de valores substantivos como a
solidariedade, a igualdade e a justiça social, e apelar à intervenção crítica e
consciente dos cidadãos no processo de transformação social, num mundo
multicultural e de contrastes que se pretende de paz e cooperação entre os povos.
Publicado no Jornal "Terra Ruiva"
Edição de Dezembro de 2015
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