domingo, 21 de dezembro de 2014

Verdade ou Mentira

A menos de um ano das eleições legislativas, à semelhança do que aconteceu ao longo dos 38 anos de democracia, o país assiste a mais uma representação teatral de mudança de turno. 

Se a história se repetir, chegou o tempo da substituição da coligação de direita pelo partido socialista, que se prepara para fazer o seu turno de serviço ao abrigo do regime de alternância ou rotativismo. 

Para o concretizar, o PS escolheu e elegeu António Costa, como personalidade melhor posicionada para executar a mudança, surgindo no último congresso do partido com uma oratória de esquerda e a contornar habilidosamente o problema José Sócrates, afirmando rejeitar coligações com a direita e prometendo entendimentos com os partidos à esquerda do espectro partidário, não se coibindo de elevar a fasquia - pediu maioria absoluta ao eleitorado para governar. 

Há razões fundadas para desconfiar das reais intenções de mudança por parte da nova liderança porque o registo histórico da governação PS, revela uma prática de direita. Entre falar à esquerda e governar à direita, a diferença é insanável. 

A este facto histórico há a acrescentar o discurso populista mas pouco inovador de António Costa que se limitou a defender a cláusula de salvaguarda para que o aumento do Imposto Municipal sobre Imóveis seja balizado, a reposição de feriados ou a apresentação da “Agenda para a Década”, que representa uma mão cheia de nada em termos programáticos. 

O país ignora a posição da nova liderança acerca de temas estruturantes como o défice e a renegociação da dívida pública, a Europa e o euro, o combate ao desemprego e o crescimento económico, a política fiscal e cortes salariais, o código laboral e direitos sociais, o Tratado Orçamental assinado em parceria com a direita, as privatizações, as parcerias público-privadas e a corrupção. 

É elucidativa a distinção e elogio que o congresso do PS fez em termos internacionais ao camarada Matteo Renzi, primeiro-ministro italiano, adepto da chamada 3.ª via e amigo do neoliberalismo, que contradiz a aposta na mudança e a inversão de políticas. 

Também é problemático acreditar na renovação quando o poder de António Costa assenta nas grandes figuras do passado (Mário Soares, Almeida Santos, Jorge Coelho, António Vitorino, Manuel Alegre) e traz para o secretariado nacional um grupo de “socratistas”. “Uma visão simplista diria que António Costa superou com distinção a prova do congresso. Encerrados os trabalhos, os seus camaradas aplaudiram de pé o reposicionamento, ainda que retórico, do partido à esquerda.” (Nuno Saraiva, DN, 01Dez14)

Apostila – a Municipalização do Ensino, inscrita no guião da reforma do Estado, é um dos objetivos do governo que está a ser negociada no segredo dos Deuses com 20 municípios que servirão de experiência-piloto para os restantes, processo preocupante, direcionado para a desresponsabilização do poder central no campo da escola pública, que sacode a água para o capote do local, que não receberá os necessários recursos financeiras para cobrir os custos das novas competências. 

Assim aconteceu com a anterior transferência de atribuições e competências para os Municípios (Ano de 2008) que envolveu a assunção do pessoal docente das escolas básicas e da educação pré-escolar, as atividades de enriquecimento curricular do 1.º ciclo do ensino básico e a gestão do parque escolar nos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico (construção, ampliação, manutenção e apetrechamento das escolas básicas). 

É mais uma aventura e experimentalismo dos governantes que inclui a transferência de responsabilidades em matéria de ordem pedagógica e gestão dos docentes (!)

Os Municípios teriam a possibilidade de contratar docentes para os chamados projetos locais ou para a componente local do currículo, podendo atingir ¼ do total de professores. 

Por intermédio de um conjunto de normas contratuais e aplicação de critérios, pretende-se chegar a um número estimado ou expetável de docentes para o concelho, fazendo-se tábua rasa das diferentes realidades territoriais e socioeconómicas dos agrupamentos de escolas, com o objetivo de reduzir o número de professores, e, imagine-se, pagar aos Municípios (a partir do limite atrás referido) 13 594,71 euros por cada docente reduzido! 

A concretizar-se o projeto do governo, de natureza economicista e acentuado pendor ideológico, dar-se-á mais um passo dramático na degradação da escola pública. 

É expetável a contestação de escolas, professores e comunidade educativa, tendo em consideração que se agravam e criam novos problemas.


Publicado no Jornal  "Terra Ruiva"
Edição de Dezembro/2014


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