O fenómeno da desertificação económica e
humana, a secundarização do investimento no interior do país e do Algarve, em especial,
é tema que volta e meia, regressa à
ribalta, num tempo em que a sua relação causa-efeito com o flagelo dos fogos
florestais é por demais evidente e pertinente.
A problemática do combate à
interioridade e às assimetrias intra e interregionais tem integrado o discurso ministerial
e de outros responsáveis políticos, ao longo dos anos, sendo vários os
acrónimos e planos criados, os programas e medidas anunciadas, que,
paradoxalmente, se revelam uma mão cheia
de nada, incapazes de contribuir para o propósito de reforço da coesão social
e territorial.
É o que acontecerá provavelmente com o Plano Nacional de Coesão
Territorial (PNCT), concebido por uma dita Unidade de Missão para a Valorização
do Interior (UMVI), que propõe um repositório de medidas bem intencionadas, sem
visão estratégica integral e global, e garantias de dotação orçamental. Inexoravelmente,
assistimos à concentração da riqueza e do investimento na estreita faixa do
litoral português e nos maiores centros urbanos (Grande Lisboa e o eixo
Porto/Viana de Castelo) que concentra dois terços da população nacional.
O
discurso da redução das assimetrias cai
por terra quando perante uma decisão de investimento relevante, os próprios
dirigentes regionais, optam por localizá-lo, invariavelmente, no litoral e nos
maiores centros urbanos. Foi o que sucedeu, curiosamente, há alguns anos atrás,
com a construção do Pavilhão do Arade nos limites de Lagoa/Portimão, quando poder-se-ia
ter desenvolvido o projeto inacabado do Complexo de Feiras e Exposições de
Silves (FISSUL), discriminando positivamente o território e obviando à duplicação
de equipamentos.
No fundo, uma oportunidade perdida para aliar o discurso à
prática. E sabe-se lá com que fundamento, a maioria que liderava à época o
Município de Silves (Março de 2000), também concordou com a proposta vinda de
Faro, em prejuízo do concelho, da racionalidade económica e do desenvolvimento
regional no seu todo.
O diagnóstico do interior é sobejamente conhecido. Os
desequilíbrios agudizam-se por força das dinâmicas económicas e sociais, das
políticas agrícolas e florestais, das políticas industriais e comerciais, dirigidas
a nível nacional sob a obsessão do défice orçamental e o garrote da dívida
pública, subordinadas aos compromissos europeus e às políticas neoliberais, que
contrariam e esmagam as políticas locais.
Não
se promove o desenvolvimento do interior, procedendo ao encerramento de
escolas, postos e estações dos CTT, delegações da EDP, tribunais, farmácias, unidades
de saúde, estações da CP (o governo permitiu à CP que
eliminasse como primeiro compromisso social, a garantia da mobilidade de toda a
comunidade, independentemente da sua condição económica ou geográfica), suprimindo carreiras de
transportes rodoviários, extinguindo paragens de comboios ou freguesias do mapa
autárquico.
As assimetrias não se combatem com a
filosofia adotada na distribuição dos fundos comunitários, marcada pela
excessiva centralização e governamentalização, o enfoque exagerado na
competitividade empresarial, os reduzidos recursos atribuídos às autarquias, as
migalhas programadas para os territórios atingidos pela desertificação e a
ilusão de que o país não precisa de mais infraestruturas físicas.
Separar a
demografia da economia e julgar que os estrangulamentos se resolvem com
incentivos à natalidade e à fixação de pessoas, ou resumir as soluções ao
empreendedorismo local e a incentivos fiscais (condição necessária mas
insuficiente), é outra ilusão que carece de desmistificação.
A soberania do
país e o desenvolvimento equilibrado do todo nacional exigem outra política
agrícola e florestal, o aproveitamento dos recursos naturais, o incremento das atividades
produtivas e do Valor Acrescentado Bruto, a substituição de importações por
produção nacional, a reindustrialização e serviços públicos de qualidade.
Publicado no Jornal "Terra Ruiva"
Edição de Fevereiro de 2018