quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Impostos ... e mais Impostos

A aplicação maximalista do memorando da troika pela maioria governamental de direita, somando austeridade a mais austeridade, num ciclo vicioso brutal e socialmente desumano, mergulha o país na recessão cada vez mais cavada.

Até a nova directora-geral do FMI, Christine Lagarde, imagine-se!, veio à liça, condenar em geral a União Europeia e vários governos pelo recurso unívoco às políticas de austeridade, sem cuidar de as contrabalançar com medidas de estímulo ao crescimento económico, acusando-os de miopia contabilística.

O governo metamorfoseou-se em cobrador de impostos, anunciando aumentos atrás de aumentos, com o denominador comum focado no ataque fácil aos rendimentos do trabalho e aos pensionistas em sede de IRS, deixando invariavelmente de lado – decerto, não por maldade, mas por preconceitos de natureza ideológica - os rendimentos do capital (lucros, dividendos e mais-valias), fazendo com que a repartição dos sacrifícios seja injusta, desequilibrada e ostensivamente assimétrica, e por conseguinte, geradora de potenciais conflitos sociais, de magnitude e figurino imprevisíveis.

A coisa é tanto assim, que o insuspeito Marcelo Rebelo de Sousa, não se coibiu de criticar a isenção dos rendimentos do capital no âmbito do imposto extraordinário sobre o subsídio de Natal, ao deixar de fora os lucros, os dividendos, o IRC das empresas e as mais-valias na área mobiliária ou imobiliária, afirmando, inclusive, não compreender a razão da medida.

Talvez por isso, o governo sentiu-se na necessidade de anunciar um suposto imposto sobre os ricos para 2012 que escamoteia e falseia a realidade. Basicamente, trata-se da sobretaxa adicional de 2,5% que incidirá sobre os rendimentos colectáveis acima dos 153,3 mil euros/ano, ou seja, 10950 euros/mês, que representa uma pequena parcela dos ricos – trabalhadores por conta de outrem com salários elevados – que pagam IRS, prevendo o Estado arrecadar cerca de 100 milhões de euros.

Confronte-se esta verba com os cortes salariais da função pública em 2011 que equivalem à perda efectiva do 12.º e 13.º meses, e à entrada nos cofres do Estado de receita superior a mil milhões de euros, e retirem-se as devidas ilações sobre a equidade das medidas de austeridade.

Causa impressão esse prurido ideológico de não taxar o capital sob o pretexto de que “…precisamos de atrair fortunas, investimento e capital externo” (Passos Coelho, dixit).

Como explicar que 17 dos 20 maiores grupos económicos (PT, Sonae, Jerónimo Martins, Galp, Petrogal, Mota-Engil, etc) cotados na bolsa portuguesa detenham sociedades gestoras de participações sociais (SGPS) sedeadas na Holanda e Irlanda que lhes permite escapar ao pagamento de impostos em Portugal?! Noutros casos, Bancos cotados no PSI20 (BES, BPI e Banif), escolheram as Ilhas Caimão ou paraísos fiscais similares para fugir ao fisco nacional.

O défice de sensibilidade social do novo (velho) governo é outra faceta que emerge no dia-a-dia. Não lembra ao diabo que o Ministro da Saúde, antigo director-geral dos impostos, opine que é financeiramente insustentável ao país, manter o actual número de transplantes no quadro do serviço nacional de saúde quando o que está em causa não é o mero acesso aos cuidados de saúde mas sim a própria vida humana.

Recusar um transplante de coração por imperativos orçamentais é criminoso e uma brutalidade hedionda. Não falta por aí onde se deva e possa cortar nas despesas do Estado, racionalizando-o, e não desmantelando-o, em prol dos negócios privados e do liberalismo selvagem.


Publicado no Jornal Terra Ruiva
Edição de Setembro/2011

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