sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Um mau orçamento

Câmara aprovou o pior orçamento pós-25 de Abril de 1974

O plano e orçamento da Câmara Municipal de Silves (CMS) para 2013 no montante de 37 milhões de euros (viabilizado pelos eleitos do PSD e PS, e a oposição da CDU ) é motivo oportuno para uma breve reflexão técnica e política sobre os documentos de gestão que em princípio orientarão a ação do município e darão corpo às políticas autárquicas durante o ano corrente.

 Este tema é tão ou mais relevante se constatarmos a ligeireza como a generalidade da comunicação social local, regional e nacional, aborda os orçamentos camarários. 

A imprensa escrita limita-se a servir de porta-voz do Presidente da Câmara ou do seu Gabinete, prevalecendo nas redações dos jornais a não certificação da informação veiculada, decerto por ausência de conhecimento específico, e a inexistência de contraditório equivalente por parte da oposição. 

Por outro lado, a imprensa especializada em assuntos económicos não se dá tampouco ao trabalho de publicar um ou outro texto de análise técnica, por exemplo, sobre os orçamentos dos grandes municípios. 

Anos a fio, hoje com menor frequência, deparamo-nos com parangonas na imprensa que anunciam a aplicação do regime de duodécimos em autarquias com orçamentos reprovados, quando o que se aplica é simplesmente o orçamento do ano anterior com as modificações introduzidas!  

No preâmbulo do orçamento da CMS para 2013, enunciado pela maioria PSD como feito notável, podemos ler: “… entendeu este executivo apresentar o mais baixo orçamento dos últimos 10 anos (37 milhões de euros), operando uma redução de cerca de 10 milhões de euros num ano.” Concluindo que “ … tal reflete uma extrema contenção nos custos…”. 

O exercício de análise é pura mistificação, indiciando impreparação, porque a comparação (indevida) é estabelecida entre orçamentos virtuais. A execução real dos orçamentos anuais tem-se situado na ordem dos 32/33 milhões de euros. Apenas abaixo destes valores é que poderíamos começar a falar eventualmente de contenção de custos. 

Chegados até aqui, restava ainda saber em que medida a redução de custos se focalizava nas despesas correntes ou nas despesas de investimento, o que faria toda a diferença. Ora, entre 2002 e 2011, as despesas correntes da autarquia quase que duplicaram (de 13,9 para 26,2 milhões de euros), enquanto a (fraca) taxa de execução do investimento programado se fixou nos 37%.  

O investimento previsto para 2013 no valor de 8 m. euros, além de largamente empolado e indefinido no concreto, inclui dívida, não se descortinando obra nova significativa. 

No ano de 2012 a autarquia silvense impôs cortes inaceitáveis de 26% nas transferências para as Juntas de Freguesia, e como se isso não bastasse, arrastou o seu pagamento até à última semana do ano (!), justificando-se, inicialmente, com a aprovação tardia do documento, e posteriormente, com a famigerada Lei dos Compromissos (em 2013 mantêm-se as verbas de 2012). 

Por toque de magia, num ápice, a mudança de presidente conduziu à resolução do imbróglio! 

A maioria esmagadora das associações culturais e desportivas não recebeu um cêntimo de subsídio no ano transato e as verbas previstas para o ano corrente refletem reduções na ordem dos 200/300 por cento! 

Assinale-se que o orçamento para 2013 não honra os compromissos não assumidos em 2012, nega procedimentos anteriores, renega, a meu ver, o bom nome da autarquia, e periga, inclusivamente, a sobrevivência de instituições norteadas pelo voluntariado que prestam relevante serviço público à comunidade. 

Somente uma avaliação muito benigna levaria a concluir que o orçamento da CMS/2013 é o orçamento possível face às doses brutais de austeridade assimétrica e ao violento ciclo recessivo que varrem o país de norte a sul. Não é exagero afirmar que é o pior orçamento camarário da história da democracia em Silves.  

O orçamento da CMS/2013 não é reflexo apenas da crise do capitalismo financeiro, do programa de resgate da troika, e da aplicação cega da doutrina neoliberal à escala nacional e europeia. 

É também consequência do preço da má gestão financeira, das políticas avulsas, das prioridades erradas e ausência de visão estratégica, durante o longo consulado do PSD/local, que a crise se encarregou de trazer para a ribalta. 

O trajeto da gestão financeira sob o comando da atual maioria está sinalizado por orçamentos irrealistas e marcado pela imprudência, processos judiciais, improviso, insustentabilidade, endividamento excessivo e desequilíbrios recorrentes. 

No ano de 2005 a autarquia confrontou-se com a situação de falência técnica. Em 2009 beneficiou de empréstimos públicos no montante de 15 milhões de euros para a liquidação total do passivo corrente. Em 2011, dois anos depois, o passivo corrente voltou a ultrapassar a barreira dos 10 milhões de euros. O “Processo Viga d´Ouro” e os “Acordos de Regularização de Dívida” subjacentes, também fizeram o seu caminho, e ainda hoje, provocam mossa em termos de pagamento de juros de mora (3,1 milhões de euros nos últimos 5 anos).

Num tempo em que o concelho de Silves carecia de um orçamento anticíclico que esbatesse os efeitos devastadores da crise na comunidade, nas empresas e nas famílias, o poder municipal segue o(s) passos  do governo … rumo à destruição da economia e ao empobrecimento salazarento da sociedade portuguesa.


Publicado no Jornal "Terra Ruiva"
Edição de Janeiro/2013



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