quarta-feira, 1 de julho de 2015

Desafio complexo no acesso aos fundos comunitários

O acesso dos municípios portugueses aos fundos comunitários no âmbito do Portugal 2020 vai ser difícil devido às redobradas exigências técnicas, restrições, critérios de elegibilidade e condicionalismos de que enferma a generalidade dos programas e regulamentos específicos. 

A título de exemplo, o Programa Operacional Sustentabilidade e Eficiência no Uso de Recursos (PO SEUR), programa temático nacional nas áreas dos sistemas de abastecimento de água, saneamento, resíduos, energia e outras, é um dos mais exigentes e centralizador. 

Abunda nos seus requisitos um número elevado de evidências, demonstrações financeiras, análises de custo-benefício, conformidades com programas e planos territoriais, indicadores de realização e resultado, cadastros de infraestruturas, exigências ao nível dos tarifários (pressão no sentido da subida de preços com vista à privatização) que comprometerão quer a apresentação das candidaturas quer o seu desfecho final. 

A linguagem hermética e tecnocrática, por vezes confusa, que é usada na redação dos objetivos temáticos, prioridades, objetivos específicos, eixos ou programas, conforme as situações, torna doloroso o exercício de direcionar dado projeto de investimento para financiamento comunitário¹. 

Ao invés, a submissão, acompanhamento e gestão das candidaturas através de portal via internet é um instrumento facilitador do acesso ao Portugal 2020. Na esfera dos municípios são exigidos “à cabeça” vários planos estratégicos ou planos de ação, dependendo do programa em concreto, com vista a garantir o enquadramento geral, uma visão sistémica e um conjunto de linhas orientadoras, objetivos, medidas e ações, subjacentes às respetivas áreas, sem os quais, não é possível o lançamento e aceitação de candidaturas. 

A contratação de resultados esperados (por ex.: criação de emprego, criação de poupanças, contributo para uma economia de baixo carbono, contributo para o Valor Acrescentado Bruto regional), calculados através do uso de indicadores e unidades de medida, de metas e objetivos previamente definidos, uma novidade no novo quadro comunitário, que é parte integrante das candidaturas, cujo eventual incumprimento após a execução dos projetos, conduzirá à devolução de fundos no todo ou em parte, atesta bem da responsabilidade e dos cuidados a ter, no acesso aos programas. 

Se no caso dos projetos empresariais privados a previsão dos resultados esperados é um processo objetivo e relativamente fácil, embora, não isento de incertezas e desvios, na área dos projetos de natureza pública, em que a relação custo-benefício é algo imprecisa e difusa, a tarefa é bastante subjetiva e portadora de entraves adicionais. 

De um certo facilitismo no passado passou-se a níveis de complexidade superior que nos levantam fundadas dúvidas sobre a capacidade do país e dos seus agentes económicos em reunirem condições para consumir os cerca de 25 mil milhões de euros durante o período 2014-2020. 

Os autarcas portugueses queixam-se em geral do carater centralizador do quadro comunitário Portugal 2020 que não assegura uma intervenção adequada dos municípios, à exceção dos programas operacionais regionais, onde têm realmente uma palavra importante a dizer. 

Na medida em que os recursos e as oportunidades são escassas, há que ir à luta e aproveitá-los. Aos autarcas, empresários e promotores diversos, não sobra outra alternativa, senão, munirem-se de informação, organizarem-se e prepararem-se tecnicamente, no “assalto” aos fundos comunitários, com vista à execução de projetos de investimento, que são sempre sinónimo de progresso social e económico. 

Contudo, não se devem semear ilusões. O novo quadro comunitário aposta demasiado na competitividade, na lógica do privado e das grandes empresas, em detrimento do setor público, relegando para segundo plano o sistema produtivo nacional, a coesão e convergência real dos países e regiões, bem como a redução das assimetrias intra e interregionais. Mas isto, é tema para uma próxima ocasião.

¹ O Gabinete de Empreendedorismo Local do Município de Silves é um serviço público vocacionado para resolver este tipo de problema

Publicado no Jornal "Terra Ruiva"
Edição de Junho de 2015





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